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sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Planeta Lamma


Desde sempre nutri uma especial admiração por artistas que fazem da rua um palco, uma passarela, um modo de vida, ou um modo de “ganhar a vida”. Ninguém precisa me lembrar, eu sei, o melhor seria que tivessem estrutura, condições de desenvolver aquilo que fazem com mais dignidade e reconhecimento. 

Quando eu era molecote ainda, e corria nas ruas do Meier atrás de bola e pipa, observava pessoas que dormiam nas marquises dos prédios. Alguns ficavam meses ali, dependendo da compaixão da vizinhança para comer pão, ganhar um troco para tomar um café, e até se vestir.

Alguns vivem nas ruas, mas não em nome da arte. Recordo de um senhor que dormia na rua em que eu morava. Um dia parei para conversar com ele que me disse estar na rua por causa das mulheres. Contou que tinha filhos e precisava voltar a trabalhar de alfaiate, sua profissão, para retornar à sua casa e reconciliar com sua esposa.  Era um homem vencido pelo vício.

No início dos anos 1980 eu estava com amigos em uma adega (flor de coimbra) na Lapa, quando surgiu um homem com aparência quase Marley e quase Hendrix, um misto indefinido dos dois mitos da música. Trazia um caderno espiral universitário em uma mão, e na outra, alguns discos.

Tentou vender os discos, mas como ninguém comprou, ele falou: - Alguém quer escrever um poema neste caderno? Eu, apoiado pelos amigos, escrevi um longo poema que ocupou duas folhas. Ele leu e disse: - Toma! O disco é seu e o poema é meu!  Uma atitude totalmente rock 'n' roll. Agradeci e aceitei a troca. Hoje tenho curiosidade em saber o que escrevi naquele espiral.

Esse artista que vendia sua arte, nunca foi reconhecido pela mídia e pela indústria da música. Gravou mais alguns discos, sempre com seus recursos, e os vendia nas ruas da cidade. Não sei por onde anda, mas o disco duplo, o álbum branco, uma raridade, sempre esteve nas malas quando das minhas mudanças: Damião Experiença – PLANETA LAMMA.


Ricardo Mezavila

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

As três rosas de Cartola



Angenor de Oliveira, nasceu em 1908 , no Rio de Janeiro. O compositor Cartola, teve três mulheres importantes em sua vida. Deolinda, sua vizinha, foi a  primeira. Sete anos mais velha, cuidava de Cartola quando este ficou doente, aos dezoito anos. Deolinda era casada e tinha uma filha de dois anos. Os dois acabaram se envolvendo e ela não voltou mais para casa do marido. Ao seu lado, Cartola viveu uma vida tranqüila. Aos trinta e oito anos Cartola ficou com a saúde seriamente abalada. Bebida, doença venérea e meningite, era o que se especulava nos becos do morro da Mangueira. Deolinda esteve ao seu lado até que ela morreu do coração aos quarenta e cinco anos.

A segunda mulher foi a causa do sumiço dele a ponto de as pessoas acharem que ele tivesse morrido, o nome dela era Donária, uma mulata gorda, metida com vários homens, até contraventores. Na época em que viveu com Donária, Cartola largou a Mangueira e mudou-se com ela para Nilópolis e depois Caju. Foi a época em que mais bebeu, dois litros de cachaça por dia, e que menos cuidava de si, abandonando inclusive o, até então, inseparável violão. Foram sete anos sem dar notícias, até samba em sua homenagem fizeram. Donária voltou para Nilópolis deixando o compositor abandonado e completamente decadente.

Dona Zica, que seria a terceira mulher do compositor, reencontrou-o na favela, no Caju, separado de Donária e sozinho. Eles se conheciam desde a infância, mas não se davam. Dona Zica era cunhada de Carlos Cachaça, grande companheiro de Cartola. Eles começaram a se envolver e ela começou a trazê-lo de volta para a vida e para a música. Foi ela quem o trouxe de volta à Mangueira.

Casaram-se doze anos mais tarde. Dona Zica foi fundamental para a reestruturação da vida e da carreira de Cartola. Na época em que estavam juntos, Cartola compôs “As Rosas Não Falam”. Ficaram juntos até a morte de Cartola, aos setenta e dois anos.

Ricardo Mezavila

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Ritos de passagem


Ritos de passagem são muito comuns em praticamente todas as culturas. Eles existem há muito tempo e são importantes na passagem da adolescência para a idade adulta, estabelecendo o desenvolvimento de uma personalidade mais responsável e madura. Na cultura ocidental, festas de debutantes ou até mesmo festas específicas de algumas religiões são comuns, mas em algumas culturas pouco conhecidas, os ritos podem ser mais estranhos, e até mesmo assustadores.

A iniciação dos garotos de uma tribo de Papua Nova Guiné começa aos sete anos, quando eles são levados para longe de todas as mulheres, e passam a viver somente com homens pelos próximos dez anos. Durante o início do ritual, a pele dos garotos é furada, para que as contaminações das mulheres sejam retiradas, e eles têm que sangrar pelo nariz para se limparem. Os garotos também têm que consumir cana de açúcar para estimular o vômito e a defecação, com o mesmo propósito. Após a “limpeza” do corpo, eles consomem sêmen, considerado vital para que eles cresçam e fiquem fortes.

Os ritos de passagem dos políticos brasileiros são bem interessantes também. Eles começam a participar da iniciação quando são eleitos, ficam quatro anos em reclusão em um local construído para que possam, tranqüilamente, receber dos mais antigos todo o conhecimento para o seu desenvolvimento. Durante este período, acredita-se que o político está no paraíso, sem risco da presença de um demônio chamado povo.

Ao final do ritual, o político brasileiro iniciado tem que enfrentar o povo, então coloca uma máscara e se torna a reencarnação do Frei Damião. Acompanhado por alguns de seus pares faz caminhadas e romarias pelas localidades carentes de sua cidade natal. Por um período de quatro meses faz promessas, é solícito e disponível. Na manhã seguinte ao dia da batalha, em que passou enganando o demônio com sua máscara, ele é reconduzido pelos parentes e colaboradores, para dar continuidade ao ritual. Neste momento, o político recebe uma caneta dourada e joga sobre o demônio. Depois disso, a tribo o considera pronto para entrar para a vida corrupta com segurança.


Ricardo Mezavila

terça-feira, 27 de setembro de 2011

Sem essa, Aranha!


Transgredir é estar inconformado com os padrões vigentes e criar algo que viole o sistema, mas que traga um conteúdo novo, uma idéia nova. Na história da humanidade existem vários personagens que transgrediram por indignação e insubordinação. Joana D’Arc, Van Gogh, Leonardo Da Vinci; foram transgressores e, por conta disso, revolucionários.

O transgressor é aquele politicamente incorreto que não liga para as ditaduras do comportamento, do corpo, da moda etc. Coloca-se em oposição ao que é pré-estabelecido e do foro do senso comum.

No Brasil, país pouco dado a grandes personalidades universais, os artistas ocupam o grupo dessas pessoas que “metem o pé na porta” para serem ouvidas e questionarem a ordem estabelecida. Se bem que, há muito tempo, não se vê um movimento intelectual digno de algum registro.

Um dos movimentos culturais que transgrediram foi o Cinema Novo. Um grupo de jovens frustrados com a falência das grandes companhias cinematográficas resolveu lutar por um cinema com mais realidade, mais conteúdo e menor custo. O que esses jovens queriam era a produção de um cinema barato, feito com "uma câmera na mão e uma idéia na cabeça". Os filmes seriam voltados à realidade brasileira e com uma linguagem adequada à situação social da época. Os temas mais abordados estariam fortemente ligados ao subdesenvolvimento do país. E assim foi.

Cineasta, que incorporou o avesso, a contracultura experimental,o paulista Rogério Sganzerla, de natureza intelectual ligado às vanguardas artísticas mundiais, dirigiu em 1968 o longa O bandido da luz vermelha, causando impacto nas cabeças conservadoras e tradicionais dos “dedo em riste” de plantão. Em 1970 dirige Sem Essa, Aranha que expõe a fome, miséria e desigualdade social que era o carimbo do Brasil militar nos porões da ditadura.

Considero transgressores os contemporâneos Cazuza, Renato Russo, Cássia Eller, Bussunda e Torquato Neto. Porque ousaram no que fizeram com talento, personalidade e aquela necessária e sadia marginalidade.

Ricardo Mezavila

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Viajando nos sonhos (para Bernadete Silva)


Eu estava sentado no chão quando Ela chegou e me deu a mão. Eu levantei e Ela falou segurando em meus braços: - Meu filho, eu não vou poder ficar muito tempo aqui!
Depois uma mulher vestida de branco, cabelo preto, muito sorridente, segurou minha mão esquerda por trás Dela, que me abraçou e chorando emocionada, disse: - Meu filho, a partir daqui, agora tudo vai melhorar.

Os psicólogos são os maiores intérpretes dos sonhos. Para Freud, há lembranças e desejos que as pessoas recalcam num baú da alma chamado “inconsciente” e, de vez em quando, essas coisas aparecem nos sonhos. Na linguagem dos psicólogos, o sonho é uma alucinação, uma viagem fantástica através do sono.

No livro A Interpretação dos Sonhos, Sigmund Freud deu caráter científico à matéria. Aproveitando o que já havia de publicação sobre o sonho, faz novas investidas, definindo o conteúdo do sonho, geralmente como a “realização de um desejo”.

Segundo um site sobre significado dos sonhos, há uns mil e oitocentos anos, um tal de Artemedoro Dalidarius reuniu em livro as interpretações dos sonhos deixadas pelos bruxos, de pai para filho, através dos séculos.

Para os espíritas, como Hippolyte Léon Denizard Rivail (Allan Kardec), os sonhos são manifestações da alma, que emigra dos corpos durante o sono, e têm uma realidade extrafísica.

Sobre a narração no início da crônica, não tem nada de científico, ou algum significado inconsciente recalcado no “baú da alma”. Mas um momento de lucidez poética, conectada ao estágio do sonho em que é possível ver, sentir, ouvir e tocar. Com essas sensações  acordei naquele dia, com a impressão de ter viajado e visitado uma pessoa querida.

Ricardo Mezavila

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Uns dias a mais


Lendo uma agenda de 2002, tive a informação de que o tempo de uma rotação da Terra é de vinte e três horas, cinqüenta e seis minutos e quatro segundos. Menos de vinte e quatro horas. Exatos três minutos e cinqüenta e seis segundos para completar o dia. Antes das vinte e quatro horas serem completadas, a Terra já terminou o serviço. O que acontece nesse intervalo? Será que a Terra vai tomar um cafezinho, vai ao banheiro, acende um cigarro?

Considerando que ela continue a rotação nos mesmos 30,4 Km/segundo – conforme a agenda – vão sobrar sempre esses intervalos ao final do dia que, acumulados, são dias sobressalentes que poderiam ser distribuídos no calendário.

Esses dias seriam livres de compromissos governamentais, profissionais, agendas políticas e reuniões intermináveis. Todos teriam que cuidar da natureza e ninguém circularia pelas ruas com carros; os aeroportos estariam fechados e todos os meios de transportes à combustível ficariam nas garagens. A bicicleta seria o único meio de locomoção para visitarmos os amigos e parentes. Nada de Internet, televisão, rádio e jornal. Afinal nos dias de lambuja seríamos livres das pressões consumistas e ninguém ia querer perder a oportunidade de dar um abraço de verdade.

Eu usaria os dias “bônus” para refletir se tenho agido corretamente com o outro e comigo mesmo; visitaria os templos religiosos; tomaria café da manhã sempre na companhia das minhas filhas; estaria presente por onde tenho andado ausente; segurava na mão do meu velho pai e o levaria à praia para andar na areia; teria mais tempo para lembrar de minha saudosa mãe; brincaria mais com meu neto; conversaria mais com minhas irmãs depois do farto almoço; faria abstinência alcoólica e cantaria mais duetos com minha doce namorada.

Enquanto ninguém revolve o que fazer com esses créditos, vou dedicar os meus três minutos e cinqüenta e seis segundos diários meditando, enviando e recebendo as energias positivas que movem o Universo.

Ricardo Mezavila

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Doando Amor




Na minha opinião, o ato mais altruísta do ser humano é o de doar órgãos, tecidos, sangue ou medula. Sendo o corpo o maior bem material, o doador disponibiliza-se em dividi-lo com quem possa vir a precisar, sem mesmo tendo conhecimento a quem se destina.

Sou doador de sangue, de plantão, e tenho cadastro no banco de medula, além de ser potencial doador de todos os órgãos que puderem ser aproveitados.

Em vida é possível doar um dos rins, parte do fígado, parte do pulmão e medula óssea. O coração, válvulas cardíacas, rins, fígado, tendão, pele, pâncreas, intestinos, córneas, ossos, cartilagem e veias podem ser doados depois de constatada a morte encefálica.

A primeira vez que o coração de uma pessoa morta palpitou no peito de outro humano foi em 1967, na África do Sul. O primeiro transplante de coração,  realizado no hospital Grote-Schuur, na Cidade do Cabo, foi bem sucedido. O chefe da equipe era o professor Christian Barnard.

"Nós, na África do Sul, tivemos que decidir o que fazer. Todos os dias víamos pacientes que não podiam ser ajudados. A única possibilidade de ajudá-los era o transplante de coração", disse o cardiologista. Barnard, que, de repente, se tornara mundialmente famoso.

Além de ser um ato de amor, é interessante imaginar que algum órgão que manteve a pessoa viva estará vivendo em outro corpo.

Depoimento de uma transplantada: “Eu agradeço infinitamente a Deus por haver colocado almas tão iluminadas no meu caminho: Ao doador, que tinha 22 anos e entrou no reino de Deus praticando a lei de amor que Cristo nos ensinou; à família do doador, porque num momento de tanta dor pela perda de um ente querido se preocupou em ajudar outras pessoas que estavam vivas e sofrendo”.



Ricardo Mezavila

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Simples Coincidência

Repararam que quando alguém fica de ligar e não liga, então você liga e a pessoa diz: -Ia te ligar agora! Ou alguém deixa um copo em cima da mesa da sala, você passa e leva para a cozinha e ouve: - Já ia lavar! Além de descompromisso, essa atitude também pode ser chamada de coincidência. A pessoa pensa em fazer a mesma coisa no exato momento em que você está fazendo.

Das simples ocorrências do dia-a-dia que repentinamente parecem estar relacionadas, até a acontecimentos distantes, as coincidências, desafiam os nossos conceitos mais fundamentais de tempo e espaço.

Uma manhã, uma mulher de Berkeley, Califórnia, fica fora de casa, sem chave, e passa dez minutos a tentar em vão entrar na casa. Aparece o carteiro com uma carta do seu irmão que vive em Seattle. Dentro da carta encontra-se uma chave sobressalente da casa que ele pedira emprestada e prometera devolver.

A definição comum de coincidência é a ocorrência de acontecimentos simultâneos que, não obstante se verificarem acidentalmente, parecem ter qualquer relação. O psiquiatra suíço Carl G.Jung era fascinado pela sincronidade de acontecimentos e utilizava isso nas avaliações de alguns pacientes.

Uma jovem diagnosticada por Jung de “psicologicamente inacessível”, por possuir um racionalismo altamente elaborado, com uma ideia de realidade geométrica que a impedia de reconhecer a existência do subconsciente, contou-lhe sobre um sonho em que ela recebia um escaravelho dourado. A jovem ainda contava o sonho quando ouviram umas leves pancadas na janela. O psiquiatra abriu a janela e um grande inseto verde-dourado, parecido com o escaravelho do sonho, voou para dentro do consultório. Jung apanhou-o e entregou a jovem: - Aqui está o seu escaravelho! A coincidência de algo inesperado e irracional fez cair a armadura de seu racionalismo e o tratamento podia agora prosseguir.

Caso você conheça alguém que tenha o hábito de esquecer de ligar, ou preguiça em lavar a própria louça diga: Aqui está o seu escaravelho! Pode ser que subitamente ela desperte. Já estou me preparando para virar colecionador de Scarabaeidae.

Ricardo Mezavila

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Quatro horas e trinta e oito segundos


Remexendo em um antigo arquivo no meu escritório, encontrei vestígios do passado: Pagenet Motorola, Máquina Yashica TRIP-305, Fita Cassete EF-X-60, Novo Dicionário da Língua Portuguesa de Aurélio Buarque de Holanda, Vídeo Cassete Samsung, Placa Fax-Modem PCMCIA, Fita de Correção auto-adesiva PIMACO para máquina de datilografia, Fitas VHS TDK, Caixa de Disquetes 1.44 MB, Programa de instalação do Wordstar e me chamou atenção um Relógio preto marcando exatamente quatro horas e trinta e oito segundos.

Mesmo que a vida seja feita de passos à frente, projetos futuros e degraus por subir, o passado é a única certeza que temos. Foi lá que idealizamos cada etapa de nossas vidas, que sonhamos realizar aquilo que fomos capazes de desejar quando crianças e adolescentes. A adolescência é o auge do passado quando nos afastamos dela. O adolescente precisa alimentar-se de barris de esperança, assim vai ter reserva suficiente para que na fase adulta não fique desiludido. O Adolescente “pode tudo”, mesmo quando é só uma estátua.

Os objetos antigos deveriam ter o poder de quando tocados, transportar-nos até a sua época. Acredito que isso possa ser possível e que existam pessoas experimentando a sensação de visitar o passado. No filme Em algum lugar do passado a personagem realizou essa viagem fantástica através do tempo. Melhor que isso só a morte.

Coloquei o relógio preto no pulso e, olhando fixamente, tentei voltar o tempo, como o Super-homem quando alterou a rotação da terra, abstraí tudo em volta e só pensei em lembrar uma data, um dia possível em que os ponteiros adormeceram naquele horário.

Não aconteceu nada comigo que eu pudesse notar, mas tenho a certeza que durante a minha tentativa, o adolescente que um dia eu fui se mexeu, e que alguém, em alguma parte do mundo, escreveu um poema.


Ricardo Mezavila

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Música Clássica Brasileira

No início dos anos 1980, havia no Brasil quem acreditasse em um governo socialista, os sindicatos se organizavam, partidos de esquerda se fortaleciam com a presença de personagens anistiados, que retornavam ao país para dar continuidade ao sonho de liberdade e democracia. A gente sonhava com essa possibilidade, acreditávamos no poder popular, depois de ingerir tequilas e muita literatura Marxista.

Em nossos debates, de reorganização da sociedade, discutíamos novos conceitos de arte e cultura. A música clássica nacional era uma dessas discussões que, invariavelmente, permeava os assuntos temáticos.

Embora tudo fosse muito utópico e todos sabiam que era ilusão mesmo, valia a pena sonhar com um modelo de sociedade que valorizasse a cultura brasileira do batuque, congo, caxambu, samba, coco, bumba-meu-boi, forró, xaxado, xote, vaneirão, maracatu, caboclinhos, maculelê, baião, bossa nova etc. Ritmos de raízes brasileiras e também oriundas da África e  de Cuba, por exemplo.

Os clássicos modernos seriam: Carlos Gomes, Heitor Villa Lobos, Pixinguinha, Hermeto Pascoal, Waldir Azevedo, Egberto Gismonti e Antonio Carlos Jobim. Na verdade tinham outros, mas não eram do nosso conhecimento por culpa exclusiva da internacionalização, sendo mais um motivo para que fizéssemos logo a revolução cultural socialista.

Em tempo de continuísmo político e sonhos devidamente sonhados, fiz uma pesquisa sobre Francisco Manuel da Silva (1795 a 1865), nascido no Rio de Janeiro, compositor, maestro e professor, impressionou o imperador D.Pedro I compondo um Te Deum (hino litúrgico católico), tendo sido nomeado diretor musical da Capela Real. 

Fundador da Sociedade Beneficente Musical e do Conservatório do Rio de Janeiro, a origem  da atual Escola de Música da Universidade Federal do Rio de Janeiro,(UFRJ) ,também foi regente do Teatro Lírico Fluminense, depois transformado na Ópera Nacional.

Sua obra de composição, não eram de grande originalidade, mas foi o autor de uma única peça que se tornou célebre, a melodia do atual Hino Nacional Brasileiro. 


Ricardo Mezavila

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

O Homem da esquina

 
Personagem de todos os dias, testemunha de todos os acontecimentos, o homem da esquina ainda tem a capacidade de indignar-se. Mesmo com o estigma do espantalho na plantação de arroz, como é visto por alguns homens de toga, ainda assim não se cala diante do espanto que assola as esquinas.

No melhor estilo “espantalho”, o secretário de segurança pública afastou meninos e meninas de um território denominado “cracolândia”, aliás, o Rio folclórico tem o hábito de incorporar lândia (território) aos locais de destaque. Por que, então,  não incorporar o IDH (índice de desenvolvimento humano) da Finlândia?

A cracolândia foi dissolvida há uns meses, mas os jovens retornaram ao local, que fica ao lado das obras do PAC (programa de aceleração do crescimento), onde serão erguidos  blocos de edifícios populares. As aves antes assustadas com o boneco vestido com roupas de homem, erguido por uma vassoura para afugentá-las, perceberam que ele é inanimado e inofensivo.

O Ministério das Cidades exige que providências sejam tomadas, para que os trabalhadores do PAC parem de pedir demissão por falta de segurança para trabalhar. O  Ministério do Trabalho fará inspeção em Manguinhos para saber das condições de trabalho dos operários. A Assembléia Legislativa pretende convocar o secretário para uma audiência pública, com a Comissão de Segurança, para dar explicações.

O homem da esquina, do alto de sua vivência, sabe que essas reuniões são ineficazes e “inacifezes”, não há colheita sem que se cuide do solo, até o espantalho sabe disso, as crianças precisam ser adubadas com amor e proteção.

O homem da esquina também sabe que crianças são como orquídeas, sensíveis, delicadas necessitam de muitos cuidados, mas que em boas condições crescem e alegram as nossas casas.


Ricardo Mezavila

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Acorrentados

Alegoria da caverna é uma teoria do filósofo Platão, e encontra-se na obra intitulada A República. Trata-se da exemplificação de como podemos nos libertar da condição de escuridão que nos aprisiona através da luz da verdade.

Platão imaginou um muro separando o mundo externo e uma caverna. Na caverna existe uma fresta por onde passa um feixe de luz exterior. No interior da caverna sobrevivem seres humanos, que nasceram e cresceram ali.

Ficam de costas para a entrada, acorrentados, sem poder locomover-se, forçados a olhar somente a parede do fundo da caverna, onde são projetadas sombras de outros homens que, além do muro, mantêm acesa uma fogueira. Imaginam que as sombras são deuses.

Um dos prisioneiros decide abandonar essa condição e fabrica um instrumento com o qual quebra os grilhões. Aos poucos vai se movendo e avança na direção do muro e o escala, com dificuldade enfrenta os obstáculos que encontra e sai da caverna, descobrindo  que as sombras eram feitas por homens como eles.

É o que acontece, mais ou menos, com as crianças nas escolas públicas. São acorrentadas a um ensino duvidoso, vivem na escuridão do saber e crescem temendo as sombras das injustiças.

Cabe a juventude quebrar os grilhões, derrubar os muros e libertar os acorrentados das cavernas.

Ricardo Mezavila

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Desígnio de Deus


Viver é um mistério tão profundo quanto morrer. Se não sabemos para onde iremos e nem de onde viemos, muito menos sabemos o que estamos fazendo aqui. As hipóteses de estarmos a passeio, ou espiando, pagando pelos pecados, aprendendo, etc. não diminui o tamanho desse grande mistério.

Quem apostaria que alguém nascido no interior de um estado nordestino, onde a família vivia da agricultura de subsistência, plantava para comer; que quando criança adquiriu uma doença que o deixou cego de um olho; que ficou na escola apenas por alguns meses, pudesse receber o título de Doutor Honoris Causa , que tivesse uma biblioteca com seu nome e recebesse um premio do Ministério da Cultura?

Antonio Gonçalves da Silva também não apostava. Terceiro lugar em uma eleição do “Cearense do século”, o vencedor foi Padre Cícero. Patativa do Assaré, poeta repentista, cantor, compositor e improvisador,viveu até os noventa e três anos sendo diversas vezes homenageado, inclusive por Fernando Henrique.

Patativa recebeu esse pseudônimo por ser sua poesia comparável à beleza do canto dessa ave. Assaré é o nome da cidade onde Antonio nasceu. Seus poemas eram feitos e guardados na memória para depois serem recitados, desenvolvendo assim uma impressionante capacidade de memorização, recitava todos os poemas, mesmo após os noventa anos. Patativa do Assaré viveu toda a sua vida na mesma cidade que nasceu.

Então, há de se levar em conta alguns fatos que nos fazem refletir sobre a nossa passagem pela vida. Sou cristão não-praticante, apesar de ter recebido olhares afirmativos, no passado, sobre um suposto ateísmo. Sou batizado, crismado e tive meu dia de anjinho na primeira comunhão. Esse é o meu currículo religioso praticante. Isso, de não ser muito religioso, não invalida minha capacidade de acreditar no invisível, ou destino.


“Caboclo Roceiro, da plaga do Norte,
Que vive sem sorte, sem terra e sem lar,
A tua desdita é tristonho que canto,
Se escuto o meu pranto me ponho a chorar.....” (Caboclo Roceiro – Patativa do Assaré)

Ricardo Mezavila

terça-feira, 13 de setembro de 2011

Ontem se foi, mas o passado continua vivo !

“Quando eu sair daqui, vamos nos casar na fazenda da minha feliz infância, lá na Raiz da Serra. Você vai usar o vestido e o véu da minha mãe, e não falo assim por estar sentimental , não é por causa da morfina. “ (Leite Derramado- Chico Buarque).

“Minha filha ganhou um gatinho e contei a Tim que ela ia dar o seu nome ao bicho. Ele adorou: “Já sei, porque é preto, gordo e cafajeste!” O gato era cinzento, magrinho e carinhoso. (vale Tudo – Nelson Mota)

“Puxa Gil, como eu gostaria de ter feito esta música. Agora, você sabe, nego, uma coisa, eu não tive nem o curso primário. Você é um cara formado, você pode dizer assim as coisas. Eu queria dizer essas coisas mas não sabia, eu não tenho estudo, eu não sabia jogar com as idéias” (Luiz Gonzaga falando sobre bossa nova com Gilberto Gil).

“O homem tinha um andar estranhamente lépido, como uma marionete manipulada por cordas invisíveis. Sua cabeça parecia se mover com um ritmo próprio. Ele usava roupas mal-ajambradas que o faziam parecer um peixe fora d’água em uma área elegante de Manhattan, tendo quase a aparência de um sem-teto. Contudo, vistas mais de perto, as roupas pareciam novas. Ao ser olhado mais próximo ainda, o rosto pálido, a barba por fazer, esse homem de meia-idade e corpo franzino parecia familiar. Sob o chapéu, o nítido nariz adunco, as feições delicadas emoldurada por um filete de barba. Ao coçar o nariz, notam-se as unhas compridas e sujas. Ao olhar para atravessar a rua, os olhos que se via eram de um azul quase tão intenso quanto o dos ovos do tordo norte-americano.
“- É o Bob Dylan!” ( Dylan – A Biografia. Howard Sounes)

Homenagem a um amigo afro-descendente que, em um debate com o príncipe  herdeiro dos Orleans de Bragança, disse : “ Quem garante que eu também não seja um príncipe, descendente de uma família real africana?!”

Ricardo Mezavila

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Preservem os poetas e os biólogos !


Poesia e Biologia. As atividades mais necessárias no planeta devido ao acúmulo da agressão ambiental, da violência contra a natureza, da destruição do ecossistema e da desorientação do ser humano.

A tendência da humanidade é: destruir, consumir e extinguir. Esse ciclo que o homem vem adotando, com mais ferocidade, nesses tempos atuais, vem sendo absorvido pelo Planeta, que vem dando sinais de reação. Assim como um lutador que, depois de acuado no canto do ringue, reage e leva o adversário à nocaute.

Biologia celular, molecular, marinha, sanitária, bioquímica, botânica, ciências morfológicas, fisiologia, genética, imunologia, ecologia, microbiologia são alguns dos conhecimentos inerentes a um biólogo. Este reúne condições científicas de preservar o que nos foi concedido, de forma divina, pelo Moço que tudo criou.

Poesia concreta, lírica, épica, estética, rimada, livre, clássica, popular, romântica, religiosa, conceitual são formas literárias da construção poética. O poeta tem, por intuição, a capacidade de enxergar além da visão comum, difícil de definir como isso acontece.

Acredita-se que a Terra poderá suportar a vida por mais quinhentos milhões de anos, acho muito difícil que isso aconteça. Apesar desse tempo não ser nada perto dos aproximados cinco bilhões de anos que ela existe. 

A Poesia facilita o entendimento do invisível, do sentimento de que as coisas precisam ser conservadas com carinho. A palavra poética define o que não tem palavras. A Biologia coloca o homem diante dele mesmo, como criatura real e responsável por todo ser vivo. 

Palavra, matéria prima do Poeta e vida, matéria prima do Biólogo, são as fontes mais seguras de alimentar a consciência, que precisam os homens, para agirem afirmativamente na preservação do meio ambiente.

Ricardo Mezavila

domingo, 11 de setembro de 2011

De malas abertas

Os relacionamentos amorosos não sobrevivem sem as crises. O que seria das florestas se não fossem as chuvas. As águas pluviais são coletadas pelos sistemas urbanos de saneamento, sendo lançadas nos cursos d’agua, lagos, lagoas, baías ou no mar.

Por que o mar não transborda com tanto fluxo de água? Porque a água evapora em um dos seus ciclos. A água dos rios chega ao mar, o sol faz com que tanto as águas do rio e a do mar evaporem, formando as nuvens; as chuvas que caem na terra são absorvidas pelo solo, e a água é armazenada em lençóis freáticos; as águas desses depósitos alimentam os rios e o ciclo se completa.

Algumas coisas na vida acontecem de maneira automática, a gente não percebe sua importância, ou mesmo, sua finalidade e significado. Acontecem e...Pronto!

Precisamos aprender a passar por momentos difíceis e entendê-los como ordem natural de um ciclo necessário para o ponto de partida. Apesar da psicanálise, ninguém entende a si mesmo o tempo todo. De vez em quando é preciso criar um ponto de restauração, quando nos sentimos bem, e retornar a ele sempre que nos sentirmos mal.

Os resíduos urbanos, quando são despejados nos aterros sanitários, passam por uma seleta individualização de suas matérias primas, estas servirão de sustento para famílias que dessa atividade sobrevivem.

Sempre que você puder, vá até o lugar aonde você despeja seus resíduos afetivos, e procure reciclar seu relacionamento com honestidade e compreensão, antes de fechar as malas.


Ricardo Mezavila

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

O Retratista


Mais comum do que imaginamos, nas ruas das grandes cidades, desabrigados e invisíveis, sobrevivem pessoas de talento vencidas pelo vício. Não possuo dados estatísticos que comprovem, ou dê credibilidade a essa constatação, baseio-me em fatos do meu  próprio conhecimento.

Nas ruas do meu bairro acompanhei a trajetória, em queda livre, de um personagem típico do que mencionei no parágrafo acima. Já o conhecia antes do nosso encontro numa praça. Ele rodeado por jovens, desenhando retratos em troca de bebida e cigarros. Cumprimentei-o e percebi que algo não estava certo. Embora nunca tenha tido uma aproximação, conhecia-o como profissional arquiteto, dito por colegas que freqüentavam o mesmo bar, na zona norte do Rio de Janeiro.

Fiquei observando sua técnica ao desenhar o rosto de um  jovem. Não sou especialista, mas ele começava o desenho a partir de traços que no início pareciam inspirados em Oscar Niemeyer. Nos primeiros traços duvidei de que desenharia um rosto. Era como se, de repente, o Museu de Arte Contemporânea virasse a Monalisa. Talvez ele ainda sonhasse em projetar uma obra prima da arquitetura moderna e acordava quando percebia suas unhas pretas de grafite. Depois de olhar fixamente para o rosto do modelo, ali na praça, e para a tela, ele assinou O Retratista e recebeu um cigarro em troca.

Depois desse encontro, tive que intervir a seu favor, quando a caminho de casa, presenciei três garçons o agredindo, expulsando-o do local onde ele abordava clientes oferecendo serviços de desenho.
 
Eventualmente encontrava o retratista perambulando pelas ruas, e reparava que quanto menos tela tinha em seu bloco, mas decadente era sua aparência. Uma maldição comparável a de Dorian Gray.

Semana passada fiquei sabendo que o retratista estava dormindo na rua e, sabe-se lá porque, acordou assustado e atravessou a rua, sendo atropelado e morto. Ele há muito já não desenhava, era um pedinte que se mostrava arredio quando eu lhe cumprimentava.

Deixo aqui esse registro solidário aos arquitetos, engenheiros, jornalistas, professores, médicos, profissionais liberais e trabalhadores de todas os setores, que sucumbem ao vício e desperdiçam talento e a vida.

O Retratista, de onde se encontra deve estar traçando os contornos das montanhas, das estrelas.E, quem sabe, através de seu grafite desenhe, finalmente, o rosto do grande Arquiteto do Universo. 

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Incoerências e Independência



A presidenta Dilma, utilizando-se de rede nacional de televisão e rádio, na véspera do sete de setembro, tratou de acalmar a população A sobre a crise financeira que, novamente, assola o mundo.

Relatório de hoje do banco suíço UBS mostra que o custo do fim do Euro será significativamente maior do que o custo de salvamento dos países mais fracos a partir de uma União fiscal. Mas a questão está longe de ser decidida com base em uma suposta racionalidade econômica strictu sensu. Uma União fiscal tem problemas políticos para se dar agora, ainda mais na velocidade que seria necessária. (blog econobrasil).

Dentro desse contexto a presidenta afirmou que esta crise, no mundo todo, não afetará o Brasil, porque nossa economia é suficientemente forte e estável, capaz de passar por qualquer variação econômica sem sofrer sérios abalos.

Continuando seu pronunciamento, Dilma pediu a população Z  que tenha paciência sobre as questões da saúde, educação e segurança. Esses básicos serviços, disse ela, ainda não estão como o seu governo desejaria, mas que com o empenho da sociedade, a compreensão do povo do primeiro ao último da fila e a confiança na estrutura das instituições governamentais, um dia, quem sabe...

Mas o povo que saber: Se o Brasil é tão forte capaz de surfar em tsunames econômicas como se fossem simples marolas do mercado financeiro; se temos reservas suficientes para atravessar o deserto das crises mundiais, por que então, cara pálida, os serviços básicos estão entre os piores do mundo ? O povo quer saber como pode um país declarar riqueza e viver mergulhado em miséria?

Ontem, no morro “pacificado” do complexo do alemão, balas traçantes cruzaram o céu dos teleféricos ou teleféretro(?) Saudando a nossa independência.


Ricardo Mezavila

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Olimpo bretão


Futebol é uma religião para nós, brasileiros, embora o futebol moderno tenha sido criado em terras distantes, na Inglaterra em 1863. Há em um manual de exercícios correspondestes à dinastia Han da antiga China, um jogo que consistia em lançar uma bola com os pés para uma pequena rede chamado  ts`Kúh (cuju). Isso a II séculos a.C. A bola já era desejo de posse muitos séculos antes do jovem Charles Willian Muller fazê-la rolar em campos nacionais.

Nascido em São Paulo, em 1874, Charles Muller era filho de um escocês e uma brasileira de ascendência inglesa. Aos dez anos foi estudar na Inglaterra e lá aprendeu a jogar futebol, tornando-se um entusiasta do esporte. Ao retornar ao Brasil em 1894, trouxe na bagagem duas bolas usadas, um par de chuteiras, um livro com as regras do futebol, uma bomba de encher bolas e uniformes usados.

Desde então, os gramados brasileiros serviram de palco para o nascimento de vários heróis dos estádios. Pelé e Garrincha ou Garrincha e Pelé, foram os astros máximos do “olimpo bretão”. Outros “deuses” também desfilaram pelos campos, como “a enciclopédia” Nilton Santos.

Considerado o maior lateral-esquerdo de todos os tempos, foi o precursor em arriscar subidas ao ataque através da lateral do campo. Nilton Santos revolucionou a posição de lateral utilizando-se de sua versatilidade ao defende e atacar, numa época do futebol onde tinha apenas a função defensiva.

Praticado pela elite branca, o futebol passou a incluir negros em seus quadros, popularizando assim o esporte. Há não muitas décadas passadas, o futebol tornou-se uma forma de jovens desassistidos ascenderem socialmente, em função dos altos salários pagos aos jogadores de talento.

O apogeu do jogador de futebol é ser convocado para a seleção de seu país. Defender as cores de sua bandeira e levar alegria ao seu povo. Assim mesmo, como os heróis. É o caso do jovem e humilde lateral esquerdo Cortês, natural do Rio de Janeiro, que jogava em times da série B carioca e, sendo contratado pelo Botafogo de Futebol e Regatas, em nove meses, foi convocado para atuar contra a maior rival da seleção Brasileira, a seleção Argentina. Com estilo, Cortês tem tudo para encher de orgulho o senhor Nilton Santos, o eterno dono da camisa 6.

Ricardo Mezavila

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Sarau Poético



Estive na Bienal do Livro como de hábito, quando esta ocorre no Rio de Janeiro. Impressiona a quantidade de pessoas que fez o mesmo, circulando pelas passarelas dos pavilhões com bolsas e livros nas mãos. Que Brasil é esse que lê? Trabalhando com educação vivo experiências desanimadoras para o futuro do livro no Brasil. Minha experiência, não-governamental, me coloca diante de jovens matriculados na rede pública com deficiência grave em língua portuguesa.

Assisti no Café Literário montado na bienal, o Sarau Poético, evento com a participação do poeta Ferreira Gullar. O espaço estava lotado para a audição. O poeta leu vários de seus poemas com pausas para bate-papos e perguntas. Como é extraordinário o bom uso das palavras, as formas que elas adquirem quando lapidadas. O livro é um baú de pérolas raras e ao mesmo tempo simples. A língua quando declama um poema se movimenta como uma borboleta voando entre as flores dos nossos ouvidos, espalhando sementes no jardim do coração de quem nos ama.

Deveria haver, principalmente nas redes públicas de ensino, eventos como o do Café Literário, onde poetas ou leitores de poesia pudessem realizar leituras acerca dessa arte. A poesia não consta nas grades curriculares das escolas.São tratadas desproporcionalmente à sua importância. Através da aparente facilidade de se construir um poema, a criança estimulada para a leitura, arriscaria algumas linhas e adquiriria interesse pela língua portuguesa no geral.

Antes de terminar sua participação no sarau, o poeta Ferreira Gullar fez uma significante observação sobre poesia. Disse que toda pessoa possui um poema ou uma frase determinante em sua vida, que sempre estarão presentes. Eu possuo vários poemas e frases retiradas de poemas que carrego comigo. Eu diria que conduzo um caminhão de poesias com as portas abertas para caronas, pelas estradas alegres da vida.


Ricardo Mezavila

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

A conta, por favor !

Se você quer saber quem são seus amigos, compre um bar. Essa afirmação verdadeira não está em nenhum livro. Faz parte de frases ditas dentro dos botecos e que traduzem, sem a psicologia acadêmica, o universo característico e próprio do ambiente.

O bar tem dois lados, o de dentro e o de fora. Nada pode ser tão bem dividido quanto esse espaço democrático. Paradoxalmente à relação hierárquica, aquele que serve é justamente quem decide até que horas você vai poder ficar ali. Podendo inclusive molhar suas meias caso você não perceba que foi dado o sinal, geralmente cadeiras viradas sobre as mesas.
   
O dono do bar além de servir e dar o troco, também é guarda de trânsito. Entra sempre alguém perguntando onde fica a rua tal;  Analista. Ouve os problemas pessoais e   a sua opinião é solicitada; Confidente. É obrigado a saber minúcias da vida alheia sem que demonstre interesse. Comentarista. Os freqüentadores sempre querem saber seu comentário sobre o jogo; Repórter. Tem que saber de tudo o que está acontecendo pela tv, e atualizar os desinformados; Celebridade. Alguns ficam horas na porta do bar ansiosos por sua chegada; Gente boa. Quando concede fiado e filho da puta quando nega.
           
Os freqüentadores também tem seus estágios. O sábio. Com mais alguns goles, se torna o cara mais inteligente do local, domina praticamente todos os assuntos, conhece tudo; Rico. Começa a pagar bebida pra todo mundo, afinal de contas todos viram seu amigo, marca festas e churrascos; Invisível. Faz um monte de coisa errada e pensa que ninguém está vendo; Inconveniente. Fica pendurado no pescoço dos outros contando piadas sem graça e ainda olhando para mulher acompanhada.
           
Quem já assumiu o comando desse tipo de estabelecimento comercial tão diversificado culturalmente, costuma dizer que é parecido com uma “prisão”. Sem horário estabelecido para funcionar, fica à mercê das repetitivas e intermináveis saideiras.
          
Os botequins surgiram com a abertura dos armazéns portugueses no Rio de Janeiro do século 19 e, desde então, tornaram-se um dos pilares da cultura brasileira.
         
Segundo Bruno Ribeiro, jornalista, antes de se tornar o ponto de encontro de boêmios, jornalistas, intelectuais, artistas, estudantes, trabalhadores de todas as áreas, enfim, o boteco já manifestava sua vocação para ser o microcosmo perfeito da sociedade brasileira. No tempo dos armazéns portugueses, quando ainda não havia o botequim propriamente dito, as mulheres compravam verduras e legumes no local; enquanto isso, os maridos aproveitavam para beber uns tragos de vinho, escorados no balcão. Logo, este hábito virou prática cotidiana e, aos poucos, o Rio de Janeiro estava repleto de armazéns que serviam bebidas e petiscos.  O costume de se reunir nestes comércios para falar de política ou futebol começou a ser passado de pai para filho.
  
No início da década de sessenta o bar e restaurante Zicartola, do compositor Cartola e sua esposa D.Zica, tornou-se local de reuniões de pessoas contrárias ao regime militar e defesa cultural da música brasileira que, segundo os músicos que lá se reuniam, estava ameaçada pela canção estrangeira.

Ricardo Mezavila

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Homem que come gente

As artes plásticas sempre me impressionaram pela admiração ou desconfiança que elas transmitem. Participei como jurado popular em salão beneficente, na Sociedade Brasileira de Belas Artes, com mais dois especialistas e não decepcionei. Meu olhar leigo foi capaz de, entre as obras expostas, indicar a mesma tela que os olhares profissionais indicaram para receber o premio máximo.

Não é difícil, mesmo não sendo estudioso, reconhecer o valor de um quadro. A intenção do artista é muito importante. Experimentei isso observando a tela “Paraty”, a primeira colocada. O artista foi fiel aos antigos casarios da cidade histórica. As ruas alagadas, os antigos lampiões preservando suas características, as sombras e os reflexos nas poças destacadas pelo pincel.           

Desconfio quando estou diante de uma arte abstrata geométrica não representativa da realidade concreta formal, com linhas superficiais contornando a esfera latitudicional, condicionando as características diversas do ambiente visual focado em uma tendência científica e intelectual. (?)

Sou admirador de Tarsila do Amaral (1886-1973), pintora e desenhista, uma das figuras centrais da pintura brasileira e da primeira fase do movimento modernista. Seu quadro 
Operários é imensamente representativo, os rostos, as fábricas e a cidade. Mesmo sem entender de arte qualquer pessoa é capaz de compreender o seu significado.

Outro quadro de Tarsila que desde sempre me chamou atenção é o Abaporu. Aquela figura de pés e mãos grandes e cabeça pequena. Sempre que olho tenho a impressão de que o sol é a cabeça. A pintora valorizou o trabalho braçal e desvalorizou o intelectual na obra, por isso a desproporção dos pés, mãos e cabeça. Outra característica do quadro é o significado de seu nome originário do tupi aba (homem), pora (gente) e ú (comer) “homem que come gente”, uma referência à antropofagia modernista, que tinha como proposta engolir a cultura estrangeira e adaptá-la à realidade brasileira.

Esse Abaporu até que é bem adaptável à minha realidade (também tenho os pés grandes) ic!

Ricardo Mezavila