Diógenes,
conhecido como o Cínico, foi um filósofo que viveu na Grécia Antiga, que fazia
da miséria uma virtude. Andava maltrapilho e teria vivido em um enorme barril, onde
residia com seus cães. Vagava pelas ruas com uma lamparina, durante o dia,
alegando estar à procura de homens honestos e virtuosos. Era discípulo de
Antístenes, que havia sido pupilo de Sócrates. Vivia como mendigo para mostrar
sua indiferença aos valores materiais daquela sociedade.
Inúmeras
são as histórias que contavam do folclórico filósofo. Uma famosa é a de que foi
visto pedindo esmola a uma estátua. Explicou-se dizendo ter motivos para isso:
primeiro a estátua era cega, não poderia vê-lo; depois, não iria ficar
acostumado a receber e a depender de alguém. Outra história dizia que certa vez
o imperador Alexandre, o Grande, teria dito: “Se eu não fosse Alexandre, queria
ser Diógenes”.
A
tragédia grega que foi a vida desse acendedor de lamparinas traz à luz e
ilumina outra história, de outra alma desafortunada com os quebrantos da vida
cotidiana. Bato à porta do poeta russo Vladimir Maiakovski, ouço o eco de um
tiro e leio o fragmento de um bilhete: “(...) o barco do amor espatifou-se na
rotina, acertei as contas com a vida”.
Motivos
não faltavam para o suicídio, o próprio poeta dava sinais disso: “Seria melhor,
talvez, o ponto final de uma bala”. Seu relacionamento amoroso com Lilya Brik,
casada com o crítico literário Osip Brik — viviam em ménage à trois —, havia
terminado; perdeu espaço na dogmática Associação Russa de Escritores
Proletários e, principalmente, com as autoridades soviéticas, além dos
problemas na garganta, o levaram a decisão do gatilho contra o peito.
O que
Diógenes e Maiakovski têm em comum? Schopenhauer escreveu que: “A solidão é o
destino de todo grande espírito”. Penso também que o distúrbio íntimo e social,
o desencantamento do mundo, a vocação pela autocrítica, o mergulho em si mesmo,
a angústia e a melancolia — agregados ao underground cultural, ao caos
da perversão e o fascínio pelo autoflagelo — fazem desses corpos, cadáveres
provisórios, embriagados de morfina.
Que a
metáfora da lamparina fique com o pavio mergulhado no querosene, iluminando os
dias e que a noite, com o sol um pouco abaixo da linha do horizonte, fique
branca, como as noites de Dostoiévski.
Ricardo
Mezavila é escritor