Ainda sonolento, liguei um antigo
celular que uso como rádio, e ouvi: “índios
da aldeia Maracanã resistem à desocupação!”. Fiquei atento ao que o repórter
falava, mas sem entender muito bem o que estava acontecendo. Foi quando ouvi: “manifestantes fecharam a radial oeste, com
reflexo na Marechal Rondon!”. Fiquei mais perturbado ainda, Candido Rondon,
indigenista, foi fundador do serviço de proteção ao índio, defensor de seus
direitos. Depois de conferir que dormi gripado e, por conta da medicação, ontem
não havia passado no botequim, pensei: Meu Deus, isso é o que chamo de
“oportunidade histórica”.
Preciso levantar e defender os
índios! Perto disso o que é a luta pelos royalties do petróleo? Os
manifestantes que estão em Brasília para, corretamente, cornetar o deputado
eleito presidente da comissão dos direitos humanos, precisam vir para cá, porque foram os
índios os primeiros brasileiros a ficarem indignados pela perda de direitos.
Ditadura, indiretas, narcotráfico, privatização, corrupção, mensalão, tudo fica
relegado a um campo menor quando temos a chance de quinhentos e treze anos
depois, consertar a sociedade a partir do início.
Todas as violências e injustiças
sociais que vivemos ao longo do tempo, tem a sua raiz no descobrimento do
Brasil, quando os habitantes do nosso território foram expropriados,
escravizados e mortos. Há duas semanas ficamos atentos à fumaça branca da
capela sistina e, hoje, precisamos ficar observando a fumaça que os índios
sitiados fazem dentro da aldeia, para que as tropas de Cabral não façam o mesmo
que a tripulação de Cabral.
O governo tenta negociar um novo
assentamento, talvez uma nova Cidade de Deus, ou Tupã? Querem trocar
“espelhinhos” em detrimento à riqueza da história, como fazem quando, encastelados,
dividem as barras de ouro e atiram ao vento a poeira dourada que sobrou para
que sustentemos nossas famílias.
Proponho aos índios que deixem a
aldeia Maracanã que está em ruínas, merecem coisa melhor, que atravessem a
passarela e ocupem os patrimônios adquiridos e agregados pela coroa, que
invadam São Cristóvão e façam do museu nacional, antigo palácio imperial, uma
“Oca de resistência”, façam da Quita da Boa Vista um quintal para suas
crianças; ocupem o Paço Imperial, a Praça da República, tudo pertence a vocês.
Mas tenham cuidado porque a
cidade está infestada de monumentos aos brancos burgueses, monarcas e
militares, alguns, os mais perigosos, estão guardados em panteões protegidos
por armas, enquanto o único representante indígena está do outro lado, que um
dia foi capital da província, na baía chamada Guanabara, que para nós é um
lugar para se depositar lixo, mas que em tupi quer dizer, o seio do mar.
Ricardo Mezavila