Foi
em mil novecentos e oitenta e seis, no Caderno B do Jornal do Brasil, que
Affonso Romano de Sant’Anna escreveu a crônica “E ainda nos acusam de
preguiçosos”. Inspirado, como ele mesmo
me disse em um evento na Casa de Cultura Laura Alvim, em um poema que meu amigo
Samuel enviou para ele. Nem precisava dizer, pois o meu nome e uma frase do
poema estão em epígrafe na crônica.
Quem
diria que sou do tempo em que os amigos enviavam cartas, se interessavam em ler
poesia, trocavam discos e livros; os jornais tinham seus cadernos de cultura
disputados nas areias e nos ônibus; o cronista sabia as entrelinhas dos
comportamentos, sabia escrever na alma o que ela sentia sem saber; a literatura
era uma arte delicada, sentava à mesa nas refeições, deitava na cama e colhia
frutos doces nos sonhos.
O
poema que Samuel enviou foi escrito sob a pressão de dias de muita dedicação ao
trabalho. Eu tinha, assim como o ator Terry Crews no seriado Everybody hates
Chris, dois empregos. Um na zona sul e outro na zona portuária, eu morava na
zona oeste, assim fica fácil entender o
porquê da pressão. Num dia daqueles saí de um emprego e fiquei vagando pelas
ruas de Copacabana sem querer ir para o Santo Cristo. Entrei em uma adega e
pedi uma caneca de vinho, bebi e fui para casa, em Jacarepaguá.
A
doçura das lembranças são brisas mornas, às vezes quentes, ás vezes frias, mas
sempre na temperatura de um sorriso monalísico e de um olhar faraônico. Olhar
para o lado é a linha do Equador entre ontem e amanhã, é o passo seguinte que
pode ser à direita, esquerda, ou o passo cego que a gente tanto usa e que um
dia se torna arrependimento e tristeza.
Affonso
Romano de Sant’Anna em sua crônica contou que, apesar de ser o povo que mais
trabalha e que tem a pior divisão de renda no mundo, o brasileiro é,
tradicionalmente, conhecido como preguiçoso. Como as coisas têm mudado muito
entre mil novecentos e oitenta e seis e dois mil e quinze, concordo um pouco
com essa fama. O trabalhador tem preguiça de enxergar que chegou ao poder,
passou pelo poder e deixou que o poder fosse roubado. Durante esse tempo ele só
queria que sua mulher não o traísse e que o patrão não atrasasse seu salário.
A
frase que serviu de assunto para o Affonso foi:...E não deixar os sonhos de
minha família nas mãos dos meus patrões. Uma frase bacana dentro de um poema
que tinha: Não encontro tempo para um encontro. Esta frase mereceu elogio, por
carta, do poeta mineiro que a comparou com uma frase de Vinícius de Moraes: “A
vida é a arte do encontro, embora haja tantos desencontros pela vida”.
Deixo
aqui, uma coisa que mudou para melhor foi a gente beijar mais os amigos, um
beijo para todos.
Macunaíma
é o caralho!
Ricardo
Mezavila.
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