Não
sei se foi só comigo, mas na primeira vez em que sobrevoei a Guanabara com
destino ao Rio, olhando o Redentor cantei: “esse samba é só porque, Rio eu
gosto de você”. Acredito que seja automático lembrar da música Samba do
Avião, de Tom Jobim, quando estamos chegando de avião e temos aquele
sentimento de que vivemos em uma cidade maravilhosa. A travessia para Niterói
também tinha seus encantos, principalmente quando chegávamos na Cidade Sorriso
e bebíamos Mineirinho, refrigerante difícil de se encontrar do lado de cá
da baía.
Reminiscências
à parte, hoje as canções são menos cheias de graça. O governo estadual comprou provenientes
da China embarcações que visam melhorar a demanda na travessia Rio-Niterói. Tudo
bem, as antigas “Martim Afonso” e “Ipanema”, são barcas que precisam ser
aposentadas dos horários agitados, da correria desses heróis trabalhadores. Podem
realizar passeios tranqüilos de turismo pelas ilhas, riscar as águas sem
pressa, ouvir risadas das crianças, afagos dos namorados e suspiros dos mais
velhos.
Voltando
às barcas chinesas, o governo cometeu uma sucessão de equívocos que me fez
pensar na música Inútil, da banda Ultraje a Rigor: “a gente faz carro
e não sabe guiar, a gente faz trilho e não tem trem pra botar”. Exatamente
como na música, o governo comprou as embarcações, só que elas são grandes
demais e não cabem no estaleiro.
Se
não bastasse essa anomalia administrativa, a barca que era para diminuir o
tempo de percurso é mais lenta. A primeira embarcação demorou três meses para
entrar em operação porque não tinha plataforma adequada, a tripulação não tinha
sido treinada e não tinha a documentação para trafegar. O governo disse que “esqueceu”
de combinar com o estaleiro sobre a manutenção da barca, ela não cabe no Píer para
manutenção e reforma.
Essa
operação custou montanhas de dinheiro que saíram dos cofres públicos. A concessionária,
que já vinha reclamando de sucessivos prejuízos, ameaça devolver a concessão ao
governo se as tarifas não forem majoradas para bancar as despesas operacionais
do sistema, as reformas nas plataformas e a manutenção das embarcações. O valor
da tarifa passaria para um valor acima de dez reais, o que geraria insatisfação
entre os usuários.
Especialistas
em mobilidade urbana dizem que as regras para o aumento de tarifa não é clara.
Ninguém sabe como se faz o preço e se calcula os reajustes. E, ainda no terreno
do surreal, o secretário estadual de transporte disse que não sabia da negociação. Saindo
das águas e indo para as ruas, o bondinho de Santa Tereza ainda não pode
circular porque os paralelepípedos, mal colocados, impedem a passagem dos
freios dos veículos. “A gente somos inútil”.
A
coisa nasceu para dar errado porque a primeira embarcação foi batizada de “Pão
de Açúcar”. Não podia dar certo mesmo, um negócio da china nunca vai se
encaixar na paisagem descolada do carioca.
Ricardo
Mezavila.
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