O
Vaticano concedeu o “nihil obstat” – nada impede - ao surfista carioca
Guido Shaffer, morto enquanto surfava nas águas do Recreio dos Bandeirantes, no
Rio. O rapaz morreu aos trinta e quatro anos, em 2009, às vésperas de se tornar
padre. O candidato a santo tem uma legião de fiéis que garantem que ele realiza
milagres. A igreja católica está reforçando seu time para suportar tempos de
intolerância, desrespeito étnico e religioso; assim como a badalada “liberdade
de expressão”.
Há
uns dias um outro rapaz, candidato a biólogo, também às vésperas de sua
formatura, foi morto por outros dois rapazes, esses já formados no crime. Alex
Schomaker estava no ponto de ônibus, em Botafogo, no Rio, e foi barbaramente
assassinado por não responder pacificamente ao já banal: “perdeu, perdeu”.
As
duas famílias sofrem a perda de seus filhos. A de Guido tem o conforto de uma
eventual beatificação; a de Alex vai ter de conviver como tantas outras que são
vítimas da incapacidade governamental de combater a violência na raiz. Parece
que a justiça celestial é mais rápida que a justiça humana. Se tornar santo,
aqui no Brasil, tem menos impedimentos do que o fortalecimento das leis sociais,
educacionais e de segurança pública.
O
processo de beatificação investiga a vida do candidato para verificar seu
testemunho de santidade. Para se tornar beato, é necessária a comprovação de um
milagre por sua intercessão. Em caso de martírio essa condição é dispensada.
Não tenho nenhuma pretensão, mas de martírio nós entendemos. Quem mora na
cidade do Rio de Janeiro, como em outras capitais, quase que completamente
dominadas pelo poder paralelo, vive sob a égide do medo e da perda. Haja santo!
As
águas do mar do Recreio levaram o jovem Guido para surfar uma onda no céu; as
ruas do Rio levaram o jovem biólogo Alex, para o céu também, mas não em uma
onda azul e cheia de poesia. A mãe de Alex disse que não perdoa os que
cometeram o crime, não tem perdão mesmo, não somos santos e não fazemos
milagres. As leis divinas não valem nos tribunais. Enquanto isso vamos
assistindo mártires aos borbotões sendo tirados de nossos convívios, deixando
de completar seu ciclo, seja no seminário, na faculdade e na vida.
Ricardo
Mezavila,
Unamar,
janeiro de 2015.
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