Em entrevista a uma emissora
portuguesa de televisão, o cantor Ney Matogrosso exagerou na exposição do caos que
se encontra a sociedade brasileira. O entrevistador ficou impressionado com o
que ouviu, não pela novidade, mas pela naturalidade com que o ex-Secos & Molhados
pormenorizava os fatos, parecia conversa de botequim. Sem cerimônia e
reproduzindo comentários simplistas, o artista disse que o governo tira casas das
pessoas, que ficam “esparramadas pelas cidades”, para construir estádios para a
copa, e que as mulheres concebem filhos para receberem mais benefícios do
governo.
O desabafo do intérprete de “Bandoleiro”
é legítimo e democrático, mas se fizesse isso em um programa de audiência aqui,
ou no congresso nacional, teria mais impacto, teria mais cobrança e sua voz
alcançaria mais ouvidos. Usar canais fora do país para denunciar as
imoralidades da “Ilha de Vera Cruz”, não acrescenta nada além de produzir material
para programas humorísticos.
É dentro de nossas fronteiras que
temos que combater a falta de seringas em hospitais públicos; a tortura
policial; as greves patronais; os vasos sanitários voadores; os “webs boatos”
assassinos e os linchamentos medievais. Estamos indignados com os gastos públicos,
com a subserviência do governo à FIFA, com os escândalos na venda de ingressos,
com as mortes dos operários e com a, inevitável, politização da copa. Os
artistas brasileiros falam pouco sobre política, muitos se beneficiam de
parcerias com o governo através de leis, como a Rouanet, e não se manifestam,
em nenhum lugar, contra os absurdos que
acontecem aqui.
Mesmo com todo abuso superficial do
senso comum, a sociedade tinha que aproveitar as águas das roupas sujas lavadas
em Portugal e tomar um banho de consciência crítica antes de enfeitar as ruas
com bandeirinhas verdes e amarelas.
Ricardo Mezavila.
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