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terça-feira, 12 de maio de 2015

Quando os padres tocaram os sinos




Aprendemos nos livros didáticos que a lei do ventre livre, assinada em 1871, era uma lei boa, que deu liberdade a toda criança, filha de escravos, que nascesse a partir daquela data. Na prática a lei servia para desagregar as famílias negras, pois seus filhos eram tirados do convívio familiar e iam para abrigos mantidos pelo governo, que acolhiam estas crianças. Oitenta por cento delas morriam antes de completar um ano de idade. O “acolhimento” desobrigava os senhores de fazenda a criarem crianças filhas de escravos.

Quando se aproximavam da adolescência e eram capazes de compreender a diferença que havia entre negros e brancos, os “beneficiados”  pela lei do ventre livre fugiam para os Quilombos a procura da liberdade negada nas senzalas. Pela legislação do Império os negros não podiam frequentar escolas, sabiam que a educação é uma alavanca social, econômica e política. Na verdade a lei fomentou o surgimento dos primeiros menores abandonados do país. Nas igrejas espalhadas pelo Brasil os padres tocaram os sinos comemorando a assinatura desta lei.

Na guerra do Paraguai que durou de 1864 a 1870, os negros eram motivados a irem para o front de batalha com a promessa de que, quando retornassem ao Brasil receberiam a liberdade e, aqueles que já fossem livres, receberiam terras. Antes da guerra a população negra era de quarenta e cinco por cento, depois da guerra passou a quinze por cento. A guerra serviu para reduzir a população negra no Brasil.

Também aprendemos nas salas de aulas que a lei do sexagenário foi uma lei boa, porque concedia ao velhinho o direito de ser livre. Com as costas trituradas pelo trabalho pesado e sem forças para produzir em alto nível, os negros escravos eram jogados nas ruas doentes e sem história, sem vínculo familiar, sem direitos que garantisse sua sobrevivência. Esta lei foi responsável pelos primeiros mendigos nas ruas do Brasil.

Nos cem anos da assinatura da Lei, em 1988, participei de um ato em frente ao Pantheon de Duque de Caxias, na Avenida Presidente Vargas, organizado pelo Movimento Negro, que denunciava a farsa da Abolição. O exército considerou uma afronta, as luzes da avenida foram apagadas durante o ato, talvez porque alguém tenha dito ao  microfone que Caxias escreveu uma carta dizendo que temia que os negros, sobreviventes da guerra do Paraguai, já que aprenderam a manejar armas, pudessem iniciar uma guerra interna.

E aqui estamos em mais um aniversário da Lei Áurea que significa algo que brilha, a lei de ouro. Só que nesse pódio os negros nunca foram representados, sequer competiram em condições de igualdade. Os escravocratas deram liberdade aos escravos como quem  dá milho aos pombos. A condição do ser livre está agregada à adequada integração social, aos serviços públicos de qualidade, ao respeito por sua cultura, à dignidade humana, à aceitação dos erros históricos e suas devidas correções. Padre  recolha vosso sino!


Ricardo Mezavila.

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