Quem passa de metrô ou de trem entre as estações de Triagem e Maria da Graça vê um cenário desumano exposto às claras. Não tem como não ficar politicamente indignado e humanamente triste com a cena. Jovens em total estado de incivilidade, dominados pelas drogas, passam os dias dormindo-roubando-fumando, bem debaixo do nariz do poder público. Aquilo não é caso de polícia, é falta de socialização e de programas eficazes na educação pública. O que era para ser saudável e produtivo vira doença e improdutividade; o que era para ter beleza e alegria é distorcido pelo ambiente degradado. Pelo menos trezentos jovens vegetam à margem da ferrovia, socialmente invisíveis à sociedade, “protegidos” por plásticos e papelões em meio aos escombros e ratos.
O Brasil, desde sempre, prima pela incapacidade de reconstruir uma forma
de reparar os erros históricos que vem desde o descobrimento. Fomos o
país que mais escravizou e o último a abolir a escravidão oficial. Na
Lapa, os escravos das drogas, ficam deitados no chão, pedem dinheiro,
seguram as pessoas. A onda de violência e ataques de usuários de crack
tem levado comerciantes a fecharem seus estabelecimentos.
Refleti sobre isso quando
voltava da gravação do programa da Angélica. Os meninos da Casa do
Menor Trabalhador foram convidados a participar do programa na companhia
do cantor Naldo, que foi engraxate na instituição. Ele recordou dos
tempos difíceis com a família, da grana curta, do preconceito e dos
sonhos que ele nunca abandonou apesar das adversidades.
Os
meninos ouviram com atenção, eles também têm sonhos, são pobres como o
ídolo foi e convivem muito próximos da realidade daqueles outros jovens
onde o sonho vai distante e viaja na fumaça das drogas.
No
recorte socioeconômico a pirâmide social tem um novo retrato que
considera além da renda, a escolaridade, o acesso a bens, a composição
familiar e região, como indicadores de pobreza.
Na
terra onde o rico, mesmo presidiário, continua no topo da pirâmide, com
direito a se aposentar e trabalhar por um salário de vinte mil reais,
fica difícil para quem vem das camadas menos privilegiadas chegar no
alto e muito menos ficar por cima, como sugere o Naldo na música, em
outro contexto.
Ricardo Mezavila
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