Acho que, por estar sem beber, as
coisas que eu faço, nos lugares que fazia bebendo, ficaram diferentes. Alguns
assuntos ficaram mais claros e outros nem tanto. As pessoas não se importam com
a minha garrafa de água e continuam filosofando como se eu estivesse
entendendo. Já aconteceu, alguns anos antes, de um bêbado conversar comigo e,
por mais que eu me esforçasse, não entendia o que ele dizia. Lá pelas tantas,
depois de “várias”, comecei a entender e essa foi a senha para eu parar e ir
embora.
De qualquer maneira, mesmo na
abstinência, aprendi a me divertir com água e refrigerante. Os lugares ficaram
até mais divertidos com a minha percepção mais aguçada para as coisas da noite.
Ontem fui a um bar com videokê e foi bem divertido assistir o inacreditável
show de ego dos cantores. Havia uma dupla que apelidei de “Os cabeçudos
cantores de Crato”. Eles cantaram umas trinta músicas internacionais e, quanto
mais eu aplaudia, mais eles cantavam, para desespero dos meus acompanhantes.
Outra dupla de cantantes “The Fat
Blonde Sisters”, arrasaram cantando Ana Carolina e Elis Regina. Ao lado da
nossa mesa estava a melhor banda, a mais animada “The Boys and Girls From Hells”,
o grupo diversificava os gêneros musicais, cantavam samba, rock nacional, forró, com qualidade, preciso registrar aqui o talento da banda; Sem falar a síndrome de Nubia Lafayete, que ocorreu perto de onde a gente estava.
Enquanto cantava uma canção “Os
Cabeçudos Cantores de Crato” cantaram a frase:“have in all” (tem em todos) e, mesmo sem entender o
que estava cantando, olhou para mim e apontou o dedo, como que querendo passar
aquela mensagem. Eu estava sob o efeito da água, ou seja, sem efeito lisérgico,
por isso entendi a relevância do gesto e fiquei a tentar desvendar o mistério
da mensagem transmitida pela grande cabeça cratense.
Falando de abstinência e mensagens, é oportuno
lembrar que Buda, por seis anos, manteve uma vida de austeridade e seguiu os
maiores mestres da Índia da época, estudando e aplicando seus métodos. Apesar
do esforço, não encontrou a resposta para alcançar a completa liberdade do
sofrimento. Ele seguiu então para Gaia, um vilarejo indiano. Lá, após 49 dias e
noites de meditação embaixo de uma árvore, alcançou o estado iluminado. Vai ver
alguém passou e disse: “tem em todos” para Buda, que entendeu a mensagem e
descobriu o que buscava em si mesmo.
Ricardo Mezavila
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